28 fevereiro, 2007

Cromos Raízes e Antenas XIII


Este blog continua hoje a publicação da série «Cromos Raízes e Antenas», constituída por pequenas fichas sobre artistas, grupos, personagens (míticas ou reais), géneros, instrumentos musicais, editoras discográficas, divulgadores, filmes... Tudo isto sem ordem cronológica nem alfabética nem enciclopédica nem com hierarquia de importância nem sujeita a qualquer tipo de actualidade. É vagamente aleatória, randomizada, livre, à vontade do freguês (ou dos fregueses: os leitores deste blog estão todos convidados a enviar sugestões ou, melhor ainda!, as fichas completas de cromos para o espaço de comentários ou para o e-mail pires.ant@gmail.com - a «gerência» agradece; assim como agradece que venham daí acrescentos e correcções às várias entradas). As «carteirinhas» de cromos incluem sempre quatro exemplares, numerados e... coleccionáveis ;)


Cromo XIII.1 - Salif Keita



O maliano Salif Keita (nascido a 25 de Agosto de 1949, em Djoliba) é na actualidade um dos mais famosos cantores e compositores africanos, com a sua junção única - e por vezes mal-amada - de música mandinga, pop, soul, funk, jazz, etc, etc... Mas a sua origem não fazia adivinhar uma carreira na música: nascido albino - sinal de azar e desgraças iminentes na sua região - e no seio de uma família nobre (Salif descende do fundador do Império Mandinga, Sundiata Keita), as suas ambições musicais foram no início tolhidas pela família, que via a música como uma actividade menor, reservada aos griots. Mas tudo muda quando, em 1967, se instala em Bamako e começa a actuar com grupos como a Rail Band (ao lado de Kante Manfila) e, na continuação, Les Ambassadeurs. Em 1984 muda-se para Paris e a sua carreira internacional cresce, fulgurante. Audições aconselhadas: «Soro», «Destiny of a Noble Outcast» e «M'Bemba».


Cromo XIII.2 - Värttinä



Grupo fundamental da folk escandinava, as finlandesas Värttinä iniciaram a sua carreira em 1983, em Raakkyla, na região da Karelia. Fundado pelas irmãs Sari e Mari Kaasinen (que continua a liderar o grupo), as Värttinä tiveram variadíssimas formações ao longo dos anos (chegaram a incluir um coro de 21 crianças), cantoras entraram e saíram, as portas abriram-se aos homens (actualmente, as Värttinä incluem seis músicos homens na sua formação), mas nunca perderam o contacto com a música tradicional da sua Karelia-natal, apesar de nos últimos anos a sua música se ter aproximado perigosamente da pop, principalmente quando o grupo trocou os temas tradicionais pelas suas próprias canções. Mais recentemente, trabalharam com o famoso compositor indiano A.R. Rahman (o mesmo da banda-sonora de «Quem Quer ser Bilionário») no musical «O Senhor dos Anéis». Audições aconselhadas: os álbuns «Värttinä» e «Oi Dai».


Cromo XIII.3 - Michel Giacometti



Às vezes, há estrangeiros que são mais portugueses do que muitos portugueses. E Michel Giacometti (na foto, durante as gravações com um gaiteiro) é disso um dos maiores e melhores exemplos. O etnomusicólogo corso (nascido em 1929, falecido em 1990) foi o responsável pela recolha de centenas de obras musicais portuguesas achadas nas aldeias de norte a sul do país, pela gravação de cantos, aboios, música de instrumentos em vias de desaparecimento, pela captação escrita e fotográfica de uma realidade e diversidade portuguesa riquíssima. Andarilho do mundo (Córsega, África, Suécia, Paris...), Giacometti fixou-se em Portugal em finais dos anos 50. Material de audição aconselhado: a caixa de CDs «Antologia da Música Regional Portuguesa» (em conjunto com Fernando Lopes-Graça), também conhecida originalmente, aquando da sua edição em vinil, como os «Discos da Serapilheira», e a histórica série televisiva «Povo Que Canta».


Cromo XIII.4 - Culcha Candela



Os Culcha Candela são um grupo multi-racial berlinense que se tem destacado com uma poderosa e irresistível mistura de hip-hop, reggae, música latina e dancehall. Cantando em três línguas - espanhol, alemão e inglês - os Culcha Candela formaram-se em 2002, tendo na sua formação os cantores e MCs Jonny Strange (Uganda), Mr.Reedoo (Alemanha), Larsito (Colômbia), Don Cali (Colômbia), Lafrotino (Colômbia) e Itchyban (Polónia) e o DJ Chino con Estilo (Coreia). Com uma fortíssima componente de intervenção política (vd. o seu DVD «Kein Bock auf Nazis», em que confrontam directamente os movimentos nacionalistas e neo-nazis alemães), os Culcha Candela são senhores de um culto cada vez mais alargado na Alemanha e noutros países europeus. Audições aconselhadas: os álbuns «Union Verdadera» e «Next Generation».

27 fevereiro, 2007

O Meu Nome É João... Maria João



O trocadilho jamesbondiano, vulgar, deste título justifica-se assim: o novo álbum da cantora Maria João, desta vez sem o seu habitual cúmplice Mário Laginha, chama-se... «João» (por sua vez, um título justificado, diz ela, «porque é assim que a tratam os amigos e as pessoas que lhe são mais próximas). O que o título não explica imediatamente é o que o álbum tem dentro: catorze canções brasileiras, de «Tico Tico no Fubá», de Zequinha de Abreu, a «Canto de Ossanha», de Baden-Powell e Vinicius de Moraes, «Dor de Cotovelo», de Caetano Veloso, «No Tabuleiro da Baiana», de Ary Barroso, cinco canções de Chico Buarque (três delas em parceria com Edu Lobo) e ainda canções de Lenine, Carlinhos Brown e Marisa Monte. Nas gravações, Maria João foi acompanhada por Mário Delgado (guitarras), Yuri Daniel (baixo), Alexandre Frazão (bateria), Eleonor Picas (harpa), com produção e direcção de arranjos de Miguel Ferreira, teclista dos Clã, e co-produção de Nélson Carvalho. A edição é da Universal Music. Ao longo da sua frutuosa carreira, Maria João interpretou diversas vezes música brasileira, e, de uma forma mais evidente, no álbum «Chorinho Feliz», em conjunto com Mário Laginha.

26 fevereiro, 2007

«Fados» - Carlos Saura Filma a Canção de Lisboa (e do Mundo)



Por estes dias deve estar a terminar a rodagem do novo filme do realizador espanhol Carlos Saura, «Fados», ele que tem feito um trajecto cinematográfico que já o levou a filmar sevilhanas, o flamenco e o tango. Apaixonado pelo fado de Amália Rodrigues, Alfredo Marceneiro e Lucília do Carmo desde há muitos anos, Saura conta em «Fados» com um elenco de luxo onde se integram fadistas como Mariza, Carlos do Carmo, Argentina Santos, Camané ou Carminho (cantora ainda sem discos editados que é, possivelmente, a maior revelação do fado dos últimos anos), os guitarristas Ricardo Rocha e Fontes Rocha, e um elenco internacional em que se incluem os brasileiros Caetano Veloso e Chico Buarque, as cabo-verdianas Cesária Évora e Lura, o cantor espanhol de flamenco Miguel Poveda ou, um pouco mais surpreendentemente, a maravilhosa cantora mexicana Lila Downs (na foto). No filme há uma busca das raízes do fado - em África, com passagem pelo Brasil - e dos seus possíveis parentescos com outras músicas como o flamenco ou os mariachis, sem esquecer a figura mítica da lisboeta Severa. O filme tem produção conjunta da Zebra Producciones, da Duvideo e da Fado Filmes.

24 fevereiro, 2007

Intercéltico do Porto - O Regresso em Abril



É uma das melhores notícias do ano: o histórico Festival Intercéltico do Porto regressa em Abril à Invicta, com grupos de Portugal, da Irlanda e da Galiza a fazerem a festa. O Festival - em 16ª edição e voltando ao Porto depois de um ano de ausência desta cidade - decorre nos dias 27 e 28 de Abril, no Cinema Batalha, com o primeiro dia a ser preenchido com concertos dos Lúmen (jovem banda folk portuense que, o ano pasado, editou um magnífico álbum de estreia, «Fogo Dançante») e dos Téada (na foto), um dos mais originais, ousados e inventivos grupos irlandeses da actualidade. Na segunda noite, a festa abre com os Mú, outro grupo da Invicta e a garantia de muitas danças tradicionais europeias a saltarem do palco para a plateia. E, na Invicta, o festival termina com o recente e excitante projecto Pepe Vaamonde Grupo, liderado por este gaiteiro das nossas terras-irmãs da Galiza. E, tal como tem acontecido nos últimos anos, o Intercéltico do Porto tem uma extensão em Arcos de Valdevez (o ano passado, aliás, o Festival - sob a designação Noites Folk - teve nesta localidade minhota o seu único «porto» de abrigo), com concertos da Brigada Victor Jara, dia 27, e dos Téada no dia 28. A organização é, como sempre, do Mundo da Canção.

23 fevereiro, 2007

José Afonso - Para Sempre!


José Afonso deixou-nos há vinte anos, mas a sua memória e a sua obra viverão connosco para sempre. Este fim-de-semana, e a começar já hoje, muitas são as iniciativas comemorativas da data, um pouco por todo o país. Todas as informações sobre as homenagens, concertos, exposições, debates... no blog da Associação José Afonso, aqui.

22 fevereiro, 2007

Maria de Medeiros Atira-se à Música... Brasileira



É uma moda ou, finalmente, o reconhecimento de que a música brasileira é ouvida e amada há muito tempo em Portugal?... O primeiro álbum a solo a sério de Teresa Salgueiro, «Você e Eu», é dedicado à música brasileira, o próximo álbum da cantora Maria João (desta vez sem Mário Laginha) também é preenchido por canções brasileiras, o primeiro a solo de JP Simões (ex-Quinteto Tati e ex-Belle Chase Hotel), «1970», tem originais dele mas assombrados pela obra de Chico Buarque. E agora a actriz Maria de Medeiros (ela de filmes de culto portugueses como «Silvestre» ou de «blockbusters» como «Pulp Fiction») estreia-se com um álbum cuja maioria de canções é também de Chico Buarque e com o resto do alinhamento a ser servido com temas de Caetano Veloso e Ivan Lins, entre outros. O álbum, «A Little More Blue», editado pela Universal, saca o título ao tema-homónimo de Caetano Veloso (de quem também canta «O Quereres»), mas é de Chico Buarque o grosso das versões - «Joana Francesa», «O Que Será», «Samba e Amor», «Tanto Mar», «Acorda amor», «Samba de Orly», «Acalanto», «Outros Sonhos» e o bastante apropriado «Ela Faz Cinema» -, com o resto do ramalhete a ser ocupado por «O Seu Amor», de Gilberto Gil, «Começar de Novo», de Ivan Lins e Vitor Martins, e «A Noite do Meu Bem», de Dolores Duran. Maria de Medeiros, recorde-se, é filha do maestro, pianista e compositor António Victorino d'Almeida e teve uma pequena participação vocal no álbum «Drama Box», da fadista Mísia.

21 fevereiro, 2007

Coimbra em Blues - Com os Azuis e Outras Cores



Três bandas de proveniência diversa - Alabama 3, Hell's Kitchen e Black Diamond Heavies - e três dos mais importantes «one-man-bands» da actualidade - Son of Dave, Bob Log III (na foto) e Scott H. Biram - vêm este ano mostrar em Coimbra que os blues são um território alargado e muitas vezes já bastante longínquo da música mandinga da África Ocidental, dos blues acústicos do delta do Mississippi ou até dos blues eléctricos de Chicago. O programa da edição deste ano do festival, que decorre dias 15, 16 e 17 de Março no Teatro Académico de Gil Vicente, é ainda completado com uma exposição e a exibição de filmes dedicados ao género.

No primeiro dia, 15, podemos assistir ao «one-man show» do canadiano Son of Dave (pseudónimo de Benjamin Darvill, ex-Crash Test Dummies) e ao concerto do trio suiço Hell's Kitchen - Bernard Monney (guitarra e voz), Cédric Taillefert (percussão) e Nicolas Roggli (contrabaixo). No dia 16 há lugar para o blues-punk do «misterioso» norte-americano Bob Log III (que canta sempre de capacete, tem uma obsessão doentia por seios e, conta a lenda, com o grau de confirmação de todas as lendas - isto é... nenhuma -, ficou sem a mão direita na infância, substituida por uma garra de macaco; ah!, e que poderá ser um dos... Strokes) e da banda do sul dos Estados Unidos Black Diamond Heavies, que apresenta muitos originais mas, por vezes, também versões de temas dos seus heróis: John Lee Hooker, T-Model Ford, Muddy Waters, Lou Reed e Tom Waits. No dia 17, o festival encerra com os sempre surpreendentes Alabama 3, aqui num concerto acústico (para quem não se lembra, recorde-se que os londrinos Alabama 3 são aquela banda do genérico d'«Os Sopranos», alegres viajantes entre a electrónica, o rock, os blues, o hip-hop, a country, inventores - e sacerdotes - da Igreja de Elvis Presley e perigosíssimos cadastrados, pelo menos no seu site) e Scott H. Biram e a sua mistura de blues, hillbilly, punk e heavy-metal. Como aperitivo para os concertos há sessões de cinema com os filmes «Honky Tonk», de Tav Falco, e «You See Me Laughin': The Last of The Hill Country Bluesmen», de Mandy Stein (dia 12), o histórico «Black & Tan», de Duddley Murphy, e «Feel Like Going Home», de Martin Scorsese, o filme da série «The Blues» que traça a viagem deste género entre África e os Estados Unidos (dia 14). Uma exposição de fotografias tiradas durante a 4ª edição do festival, da autoria de Nuno Patinho e Pedro Medeiros, pode ser visitada entre os dias 12 e 19. Mais informações aqui e aqui.

20 fevereiro, 2007

Lúcia Sigalho Leva a Kizomba P'ró Teatro



A companhia de teatro Sensurround, de Lúcia Sigalho, estreia dia 22, quinta-feira, o seu novo trabalho, «Kizomba», peça baseada e inspirada neste escaldante género musical angolano (e com ramificações posteriores em Cabo Verde, Holanda, Estados Unidos e Portugal). Com interpretação de Cláudia Jardim, Lúcia Sigalho, Victor Gonçalves e as participações especiais do professor de danças africanas Aires Silva e do DJ Lucky, o espectáculo sobe à cena na Casa d'Os Dias da Água, dias 22, 23, 24 e 25. E, para melhor se perceber o que nos pode esperar, aqui fica o texto explicativo da coisa: «Quisemos começar pelo óbvio. Há sete anos fizemos um trabalho com o Fernando Alvim chamado Dedicatórias. Um dia, ele foi dançar com a Clara Andermatt no B.Leza e, à persistÍncia da falta de concordância na passada, resolveu o problema logo assim: isto em Angola dança-se doutra maneira: vou-te mostrar – chama-se kizomba!... Ele ficou nas nossas vidas para sempre. Há três anos que está a fazer uma Trienal de Arte Contemporânea em Angola. Nós ainda nunca lá fomos e quisemos mesmo fazer e apresentar esta primeira parte do trabalho para a Trienal de Luanda assim: sem nunca lá ter ido, a Angola. Trabalhámos sobre lugares imaginários, imaginados, sobre uma ideia de África, um desejo por África, um silêncio pequenino dentro do coração, saudades de um lugar que nunca existiu. Concluímos que, no fundo e secretamente, o que nós queremos mesmo é ir para essa África nossa e ficar lá muito quietos e calados... Mergulhados em sol, calor, espaço. E, ao mesmo tempo, queremos mais do que tudo, nunca, mas nunca por nunca ser, ter de voltar a esta terra... Whatever it means, voltar... Obviamente, e esta maneira de fazer é intencional, quisemos começar pelo começo e pelo óbvio: Como no amor, como se estivéssemos completamente desprevenidos, desprotegidos, sem querer saber. Quisemos partir do zero, daqui, de Lisboa, com Kizomba, renitências, resistências, dúvidas insolúveis, clichés incontornáveis, preconceitos díspares, confusões insanas, tremeliques vários e muito, muito frio. Já reparou no frio que faz neste Inverno?».

19 fevereiro, 2007

África Global - Reggae, Hip-Hop e Rock Ácido na Terra-Mãe


Se o «bom filho à casa torna», o mesmo acontece muitas vezes com a música, em viagens contínuas entre lugares de partida e chegada e partida outra vez. Hoje falo aqui de quatro álbuns, uns mais recentes que outros, quatro excelentes exemplos de músicos e grupos africanos que vão a Ocidente buscar de volta muita da música que um dia partiu de África e a este continente está agora a voltar: K'Naan e o grupo Daara J (na foto) no hip-hop, Tiken Jah Fakoly no reggae e Ba Cissoko na música mandinga mas com os blues e rock ácidos de Jimi Hendrix transpostos para koras acústicas e electrificadas.



BA CISSOKO
«ELECTRIC GRIOT LAND»
Totolo Limited/Megamúsica

O título do álbum não engana e é bem uma prova de que a influência de Jimi Hendrix é assumida claramente por Ba Cissoko e o seu grupo homónimo: «Electric Griot Land», variação sobre o título «Electric Ladyland», de Hendrix. Mas também está lá bem presente a palavra «griot». Um título perfeito para um álbum em que a música mandinga de raiz - e estão lá as koras e os balafons, as cabaças e os djembés em estado puro, e algumas canções tradicionais que os griots passaram de geração em geração, nas vozes - se funde na perfeição com os blues, o rock ácido de Hendrix, o psicadelismo, o dub (em «Adouna»), o hip-hop (K'naan é a voz convidada em «Silani»), o reggae (Tiken Jah Fakoly canta em «Africa» e em «On Veut Se Marier») e híbridos disto tudo com a ajuda do duo feminino franco-camaronês Les Nubians (em «Women [Dounia Guinee]» e em «Tjedo»), e também via guitarras eléctricas e koras em distorção. Um disco variadíssimo, riquíssimo, pulsante de ideias e uma música novíssima que só podia partir de África. Neste caso, da Guiné-Conacri, casa do cantor, compositor e tocador de kora acústica Ba Cissoko (Kemintan Cissoko) e da sua banda, onde pontifica Sekou Kouyaté, na kora electrificada, transformada e distorcida. (9/10)


TIKEN JAH FAKOLY
«TIKEN JAH FAKOLY»
Wrasse Records/Universal Music

Originário da Costa do Marfim, tal como Alpha Blondy, Tiken Jah Fakoly está também a crescer no circuito reggae mundial mercê de uma fusão muitíssimo bem-conseguida deste género jamaicano com músicas africanas de diversas proveniências (oiça-se o belíssimo «Alou Maye», que até tem ecos de fado!, um qualquer fado africano irmão da morna e primo da música mandinga), do norte árabe ao Ocidente dos griots - Fakoly nasceu no seio de uma família de griots -, com passagens pelo ragga e pelo funk. E neste álbum, homónimo (edição para o mercado anglo-saxónico do álbum «Coup de Gueule»), produzido por Tyrone Downie (o ex-teclista dos Wailers de Bob Marley), com a fabulosa secção rítmica formada por Sly Dunbar (bateria) e Robbie Shakespeare (baixo), Fakoly dispara mensagens de paz, de solidariedade, de intervenção política (verificar por exemplo em «Quitte Le Pouvoir», endereçado ao presidente Laurent Gbagbo, que mandou assassinar vários amigos de Fakoly), cantadas em francês ou em línguas africanas. No álbum, para além de Sly & Robbie, participam ainda mais uns quantos convidados de luxo, entre jamaicanos e africanos, como U-Roy, Anthony B., o rapper Didier Awadi (dos Positive Black Soul), o griot Saramba Kouyaté e Yaniss Odua (cantor emergente da cena dancehall). Uma festa feita, também, para pensar e agir. (8/10)


DAARA J
«BOOMERANG»
Wrasse Records

O hip-hop é actualmente uma realidade incontornável em todo o continente africano - com grupos, DJs e MCs a nascerem um pouco por todo o lado. Entre eles, os senegaleses Daara J estão na linha da frente com um hip-hop nunca fechado nos parâmetros do género, antes abrindo-o a mil outros géneros musicais. À música africana, claro (e basta ouvir este álbum para perceber a riqueza meódica, rítmica e harmónica que os três Daara J encontram na música da sua terra-mãe), mas também indo a ritmos latino-americanos (como em «Esperanza» (numa electrizante parceria com Sergent Garcia), funk, reggae, música árabe, etc, etc., para desembocar por vezes numa música que só podia vir dali, de África (cf. em «Le Cycle», com a fabulosa cantora Rokia Traoré a dar uma ajuda). Curiosamente, ou talvez não, os Daara J defendem que o hip-hop não é uma invenção recente, norte-americana, mas que o «flow» dos rappers descende directamente de um estilo vocal senegalês, o tasso. Diz Faada Freddy, o líder dos Daara J, que «o "tasso" é a forma original do rap, uma antiga poesia rítmica passada de pais para filhos; uma poesia que fala da realidade envolvente, das condições de vida, da situação do país e das esperanças para o futuro». E o hip-hop faz a sua viagem de volta num «Boomerang». (8/10)


K'NAAN
«THE DUSTY FOOT PHILOSOPHER»
Track & Field Productions/SonyBMG Canada

Quem viu o concerto de K'Naan, o ano passado, em Sines, sabe perfeitamente do que se fala aqui: de um rapper inteligentíssimo, com uma escrita fabulosa, um «flow» pessoalíssimo, uma ideia de hip-hop que está nos antípodas daquilo que algum hip-hop norte-americano (e outros) tem de pior na actualidade: a promoção da violência, de hábitos luxuosos, de ideias machistas... Oiçam-se os tambores de água e a voz feminina em «Wash It Down», o ritmo imparável e irresistível das percussões africanas e das vozes (que fazem por vezes lembrar os cantos tuaregues) em «Soobax», a crítica directa ao gangsta-rap em «What's Hardcore», a irreverência quasi-pop de «I Was Stabbed by Satan» (que faz lembrar... Beck), as guitarras eléctricas incendiárias do fabuloso tema rock «If Rap Gets Jealous», o gnawa de «Hoobaale», os arranjos sempre diversos e sempre inventivos presentes neste álbum e perceber-se-á que K'Naan é um dos mais excitantes e originais cantores e compositores da actualidade. Nascido em Mogadíscio, na Somália, mas radicado no Canadá, com parcerias com gente tão diferente quanto Tricky, Zap Mama, Youssou N'Dour, Mos Def ou Damian Marley, com uma visão do mundo fortemente engajada em ideais de justiça e desenvolvimento para o seu país de origem e a África em geral, K'Naan faz a ponte perfeita entre o hip-hop, a música africana, muitas outras músicas e uma música ainda por vir. (10/10)

16 fevereiro, 2007

Luar na Lubre - Os Nossos Irmãos Galegos



Os Luar na Lubre são um dos mais importantes grupos folk galegos. Com uma carreira que conta agora cerca de vinte anos, o grupo difundiu por todo o mundo a música da nossa irmã Galiza, cruzou-se com muitos e variados músicos - irlandeses e mexicanos, bretões e argentinos e portugueses, da folk ou de outras áreas musicais -, numa busca incessante das raízes da música galega na sua Galiza, sim, mas também em Portugal, nos territórios e países ditos «celtas» e na América Latina. Um grande amor pela obra de José Afonso e, mais recentemente, a entrada na banda da cantora portuguesa Sara Vidal (que substituiu Rosa Cedrón) estreitaram ainda mais os laços entre nós, portugueses, e os Luar na Lubre. Em homenagem à banda, aqui fica uma entrevista publicada originalmente no BLITZ em Abril de 2002.



LUAR NA LUBRE
A LUA É UMA BARQUINHA

Ao longo de dezasseis anos, os Luar na Lubre confirmaram-se como um dos mais importantes nomes da cena folk da Galiza. De A Coruña para o mundo foi um passo, dado com firmeza e classe, por um grupo que respeita a tradição mas não se deixa dominar por ela, abrindo o seu som e ideias a outras músicas e culturas. Nesta conversa com Bieito Romero - gaiteiro, sanfoneiro e acordeonista do grupo - falou-se de tradição, de política, do movimento folk galego, do novo álbum que vem aí - «Espiral» - e do concerto que vão dar em Lisboa, esta semana.

Os Luar na Lubre nasceram em 1986, tendo como ideia-base a recriação do cancioneiro tradicional galego e cantando numa língua, o galego, que centenas de anos de tentativas de unificação espanhola e dezenas de anos de franquismo tinham tentado remeter para um canto esconso da memória. Diz Bieito: «No início começámos com a ideia de trabalhar sobre a cultura tradicional da Galiza. No aspecto da música tradicional havia muitas carências e a ideia era fazer chegar a música tradicional - que na sua origem é mais dura do que a nossa - a muito mais gente. Temos sete discos editados - já contando com "Espiral" - e a nossa trajectória é reconhecível desde o início até agora. Mas é claro que há uma evolução a nível pessoal, como músicos, a nível de grupo e até a nível ideológico - passados todos estes anos podemos falar com mais propriedade sobre muitas coisas». O percurso dos Luar na Lubre - uma viagem em que à música galega se podem juntar a música do norte de Portugal, bretã, irlandesa e escocesa, como se a barca tripulada pelos Luar na Lubre fosse aportar nos centros principais da cultura céltica - é paralelo ao de outros grupos e artistas galegos que partiram em busca de raízes comuns. «A folk, na Galiza, evoluiu mais ou menos da mesma maneira que nós. Há quinze, vinte anos, não havia nada mas acreditava-se que poderia haver um movimento; movimento que, de facto, aconteceu. No final dos anos 90 teve o seu pico, até a nível comercial, com alguns sucessos de vendas, não só na Galiza como em outras regiões de Espanha».

A questão seguinte é tentar saber se há algum posicionamento evidente, em termos políticos, dos Luar na Lubre, coisa que nas suas letras é, muitas vezes, mais indiciada do que declarada. Diz Bieito: «A música, mesmo quando está desligada da política, assume através da cultura um compromisso social, com a terra, com o idioma, com as nossas raízes...». Acrescento que, de uma maneira mais evidente, os autores de quem eles fizeram ou fazem versões, não eram propriamente inocentes em termos de posicionamento político: o português José Afonso, o chileno Victor Jara ou o poeta - assassinado durante a guerra civil espanhola - Federico Garcia Lorca. «Não queria dizê-lo de uma maneira tão óbvia, mas já que tu o dizes... (risos) Não queremos que nos liguem a nenhuma formação política concreta, mas há, de facto, directrizes, uma maneira de trabalhar, umas ideias e uns ideais... Somos galegos e temos um importante compromisso social e, principalmente, cultural com a nossa região. Os 25 anos de democracia em Espanha não trouxeram grande coisa à Galiza. No campo da música, não há o mínimo apoio político ou institucional ao nosso trabalho ou ao trabalho de outros grupos da mesma linha, ao contrário do que aconteceu na Irlanda, onde a música se tornou uma das mais importantes fontes de entrada de divisas. Na Galiza apoia-se a moda, os vinhos, o marisco. Não tenho nada contra, mas porque não a música?... É um valor tão exportável como os outros».

O desinteresse do poder central perante o movimento folk e da música tradicional na Galiza não impediu, contudo, que esse movimento crescesse imenso nos últimos anos, tanto a nível de grupos e artistas, como de escolas e orquestras que pegam nas gaitas-de-foles ou nas pandeiretas para se exprimir e transmitir as músicas ancestrais da Galiza. «A chave está no interesse genuíno das pessoas pelas raízes. Há uma consciência e uma militância muito grandes nas escolas de música tradicional. Antes de nós aparecermos, praticamente esse movimento não existia. Havia gaiteiros dispersos, praticamente não havia pandeireteiras e daí surgiu um mundo que, todavia, estava vivo. Nós surgimos nas cidades, alimentando-nos do património importantíssimo que vem das aldeias mas, ao mesmo tempo, pelo nosso trabalho, esse património regressa às aldeias e cresce».

Num grupo como os Luar na Lubre a etiqueta "música celta" é redutora ou não?... «Nós assumimos a etiqueta de música celta. Pertencemos a um universo atlântico, que engloba uma forma de ser, de viver, de compreender as coisas. E esta é uma cultura universal, ao contrário do que muita gente pensa. Encontramos galegos, irlandeses, etc., e os seus descendentes em muitas partes do mundo. Por exemplo, na América, com descendentes de irlandeses no Norte e de galegos no sul. Um dos nossos próximos projectos é, precisamente, tentar recolher de volta a música que os galegos levaram para a América do Sul e aí se desenvolveu» [Nota actual: projecto que veio a concretizar-se no álbum «Saudade»].

Este eixo «céltico» será ainda mais perceptível no próximo álbum do grupo, «Espiral», que conta com a produção - e gravação de alguns instrumentos - de um dos nomes maiores da folk irlandesa, Donal Lunny (fundador de grupos seminais como os Planxty, Bothy Band e Moving Hearts e produtor e/ou colaborador de gente tão diversa como Elvis Costello, Sinéad O'Connor, Clannad, Mark Knopfler ou Van Morrison), para além do acordeonista Mairtin O'Connor e da violinista Nollaig Casey. E Bieito está encantado: «A nossa música é muito mais bem compreendida em Dublim do que em Madrid. E esta foi a nossa primeira oprtunidade de trabalhar com músicos irlandeses... Donal manteve connosco uma relação de respeito absoluto. Mudou alguns pormenores aqui e ali, mas 99 por cento dos nossos arranjos foram mantidos. Ele - e o técnico de som Tim Martin - deu uma cor especial à nossa música. O som ficou mais aberto». Os Luar na Lubre são muitas vezes caracterizados como «folk de câmara», não sendo tão festivos, dançáveis ou físicos quanto outros grupos galegos. Bieito concorda, mas só até certo ponto: «Isso acontece mais nos discos do que nos concertos. Ao vivo temos essa parte da festa, apesar de termos uma parte lírica que gostamos que seja ouvida. Mas é verdade que por vezes nos acusam disso. Acho que o "Espiral" já se aproxima mais - se não totalmente, pelo menos em parte -, do nosso som ao vivo».

Falando em «som ao vivo», os Luar na Lubre tocam esta semana, dia 14, na Aula Magna, em Lisboa. E aí poderemos constatar a beleza das canções e dos arranjos de um grupo que através da voz e violoncelo de Rosa Cedrón, nas gaitas, acordeão e sanfona de Bieito e nas flautas, percussões, guitarra e bouzouki dos outros músicos do grupo, está com os pés bem plantados na tradição mas com a cabeça posta no futuro. Para Bieito, o concerto vai ser uma revisão de carreira - ao jeito do que se pode ouvir no álbum «Lo Mejor de Luar na Lubre - XV Aniversario», editado o ano passado -, mas também «já com alguns temas de "Espiral"». Da contribuição de Mike Oldfield para o reconhecimento internacional do grupo acabou por não se falar. Mas depois de tantas provas dadas pelo grupo, ainda seria necessário?

15 fevereiro, 2007

Tuxedomoon - Amanhã em Portalegre



Depois de um alucinante concerto/experiência visual em Aveiro, no SET, os Tuxedomoon regressam amanhã, dia 16, a Portugal para um concerto único no Centro de Artes do Espectáculo de Portalegre. A banda norte-americana - nascida em 1977 pelas mãos de Steven Brown e Blaine Reininger - vem apresentar o seu novo álbum, «Bardo Hotel Soundtrack», banda-sonora para o documentário «Bardo Hotel», realizado por George Kakanakis com a ajuda preciosa dos próprios Tuxedomoon. Com Blaine Reininger (voz, violino, guitarra-eléctrica e computador) e Steven Brown (saxofones, clarinete e teclas) vêm dois outros históricos do grupo: Peter Principle (guitarra e baixo) e Luc Van Lieshout (trompete e harmónica).

Misturando no seu som rock arty, experimentalismos, free-jazz, mergulhos em várias músicas étnicas e uma tendência saudável para cruzar o limiar da música erudita, sem tabus ou preconceitos e sem nunca por lá permanecer muito tempo, os Tuxedomoon foram um dos grupos de proa do pós-punk norte-americano da passagem dos anos 70 para os 80. Mais admirados, seguidos e amados na Europa do que no seu país-natal, os Tuxedomoon não resistiram muitos anos como conjunto, tendo os seus membros abraçado outros projectos ao longo dos anos - e isto embora Steven Brown e Blaine Reininger tenham actuado como duo variadíssimas vezes sem fazer uso do nome que lhes deu fama. Em 2004 regressaram com um álbum, «Cabin in the Sky», que alguns fãs consideraram pop, se se entender por pop canções hiper-inteligentes, não lineares e com letras que podem visitar alegremente a língua italiana e francesa. E, em finais do ano passado, editaram ««Bardo Hotel Soundtrack», inspirado na técnica do cut-up desenvolvida pelos escritores da beat-generation e, mais especificamente, num autor dessa geração, Brion Gysin, cujo livro «The Last Museum» (em que se fala de um Bardo Hotel mítico; «bardo» é, no budismo tibetano, um estado intermédio entre a Vida e a Morte) serve de base ao filme e à banda-sonora. Citando a tradução do «Expresso» das palavras dos Tuxedomoon: «"Bardo Hotel" compõe-se de fragmentos/extractos/uma construção de elementos sonoros e derivas visuais. É uma estrutura "free-form", constantemente desenvolvida, desconstruída e remisturada com o único objectivo de criar um corte, uma fissura, um espaço para quem vê poder livremente imaginar. (...) "Bardo Hotel" é uma ausência de rumo, uma técnica de passagem rápida através de ambientes diversos». Mais informações aqui.

14 fevereiro, 2007

Que Saudades do Neo-Swing!



Um dos movimentos - se assim se pode chamar - mais curiosos, frescos e divertidos de finais do século passado (o século XX, claro) deu pelo nome de neo-swing. Grupos de músicos brancos norte-americanos atiraram-se à herança do swing - música negra, com as raízes em África e os ramos estendidos entre Nova Orleães e os grandes palcos norte-americanos (o swing foi a primeira manifestação do jazz a ser massivamente consumida pela população branca) -, misturaram-lhe outras músicas, do ska ao rock'n'roll, blues, calipso, cajun, soul, etc, etc, etc... e fizeram uma música que, se não era «original», era pelo menos muito boa, hiper-dançável e esfusiantemente alegre. Cerca de dez anos depois do pico do movimento, tenho saudades de muitos deles. E, não sei muito bem porquê, acho que esta é a melhor música que se pode querer no dia de S.Valentim. O texto que se segue foi publicado originalmente no BLITZ em Dezembro de 1998.


NEO-SWING
A MENINA DANÇA?

Não gosto de dançar. Não sei dançar. Não quero dançar. Sempre que levanto um dos pés num gesto que vagamente se aproxima de um passo de dança pareço um pato em cima de uma chapa de metal quente ou um patinador de gelo em início de carreira. Sou pesado, desajeitado, pouco maleável (se bem que esteja a melhorar a pouco e pouco). Depois - talvez por isto; um psicólogo qualquer poderia explicar - nunca gostei de música de dança na generalidade. Odiei profundamente o disco-sound, tive um desgosto enorme quando os New Order renegaram (só em parte, eu sei) as origens sisudas da banda nos Joy Division e passaram para as pistas das discotecas, nunca achei graça aos grupos que faziam a ponte entre o rock e a «club culture» como os Happy Mondays, por exemplo. E fico com pele de galinha e batimentos cardíacos logo alterados sempre que oiço falar de tecno, de house, de drum'n'bass.

Bem, e depois?... Depois, isto tudo serve para dizer que, apesar disso, um homem não pode passar a vida a ouvir só Nick Cave, country alternativo, Tindersticks, músicas étnicas e pitadas de jazz e de música clássica. E também precisa de se divertir de vez em quando. Foi isso que me fez começar a ouvir, cada vez mais, e (tentar) dançar, porque não?, a música de uns combos que estão a brotar já em boa quantidade nos Estados Unidos e que, cada vez mais, merecem a nossa atenção. Respondem por nomes bizarros como Squirrel Nut Zippers (na foto), Royal Crown Revue, Cherry Poppin'Daddies, Brian Setzer Orchestra, Hepcat, The Mighty Blue Kings ou Big Bad Voodoo Daddy e que, para simplificar, se integram num movimento a que se chamou neo-swing. Nada mais justo: a base das canções originais (sim, porque quase nunca fazem «covers») destas bandas - formadas, não tão estranhamente quanto isso, por músicos brancos - encontra-se nos grandes clássicos do swing dos anos 20, 30 e 40. O dixieland, o ragtime (para simplificar, formas «primitivas» de jazz tal como nós o conhecemos) e, principalmente, o swing de Nova Orleães e de outras cidades «negras» americanas - e nomes como os de Louis Armstrong e Cab Calloway ou as big bands de Benny Goodman, Duke Ellington, Count Basie, Glenn Miller, Gene Krupa, numa miscelânea de músicos negros e brancos - estão permenentemente presentes como referência fundamental na música dos novos grupos de swing. Grupos em que não entram sintetizadores, samples, caixas-de-ritmos ou outras «modernices» e só muito raramente uma guitarra eléctrica, antes apostando no som «natural» de pianos, secções de metais, contrabaixos, baterias simples, às vezes um violino ou um banjo e... vozes, muitas vozes em jeitos de «crooner» retro (aposto tudo em como, para além do Armstrong ou cantoras como Mildred Bailey ou Billie Holiday, eles andaram quase todos a ouvir o Johnny Hartman e, no caso do Brian Setzer, obviamente o Elvis Presley).

Aqui, exigem-se alguns pormenores sobre cinco das bandas referidas, cujos álbuns - pelo menos alguns deles - se encontram à venda nas melhores lojas de discos de Lisboa:

Cherry Poppin Daddies: originários de Eugene, Oregon, são liderados por uma personagem chamada Steve Perry e dividem os seus interesses musicais entre o swing e o ska (neste caso, eles podem ser emparelhados com bandas como os Reel Big Fish e Mighty Mighty Bosstones, por exemplo). No início, a banda teve problemas porque o seu nome poderia ser entendido como uma alusão ao incesto. Som: swing mas também sons mais tribais, mais «exotica», mais ska, mais cabaret, mais calipso. Disco aconselhado: a compilação «Zoot Suit Riot» (que reúne os seus temas mais swing, deixando de fora aqueles que estão mais próximos do ska, se bem que dele tenha pitadas).

Brian Setzer Orchestra: Depois do fim dos Straycats - banda emblemática do rockabilly dos anos 80, juntamente com os Matchbox e, noutra onda, os Cramps -, Brian Setzer inventou a Brian Setzer Orchestra (uma big band de 16 elementos, mais coisa menos coisa, que o acompanha lá atrás), com influências swing mas também, obviamente, do rock'n'roll dos anos 50 - aquando da saída do seu primeiro álbum sob esta designação, Brian Setzer foi consideardo um «Harry Connick Jnr. com atitude». Neste rol de grupos, a B.S.O. é a única que tem, em permanência, uma guitarra eléctrica. Outros sons, para além do swing e rock'n'roll: boogie-woogie, surf-music, twist, cha-cha-cha. Discos aconselhados: «The Brian Setzer Orchestra» (com muitas «covers»), «Guitar Slinger» e «The Dirty Boogie» (curiosidade: Gwen Stefani, dos No Doubt, colabora no tema «You're The Boss», popularizado pelo rei Elvis, the Pelvis).

Royal Crown Revue: Septeto de Los Angeles, liderados por Eddie Nichols, os Royal Crown Revue misturam o swing, está bem, com músicas de filmes negros/série B de faca, metralhadora e alguidar, e sons sacados a big bands mais «evoluídas», digamos assim, próximas do be-bop. Uns pozinhos de blues, de soul, de músicas do Caribe e de... Frank Sinatra, e ambientes mais próximos de Chicago e de Las Vegas do que de Nova Orleães fazem o resto. Discos aconselhados: «Mugzy's Move» e «The Contender».

Big Bad Voodoo Daddy: Originários da Costa Oeste dos Estados Unidos, a partir de obscuras bandas punk, os Big Bad Voodoo Daddy (liderados por Scotty Morris) são, talvez, o mais «clássico», destes grupos - embora o tenham definido, no início, como «high-octane nitro jive» ou «big band gone crazy». Com um piano permanente e uma secção de metais que segue quase religiosamente os ensinamentos das big-bands clássicas do swing, com solos de vários instrumentos e tudo (coisa rara nos outros). Outros sons: rock'n'roll, ska, slows fumegantes e que apelam ao strip-tease. Participaram no filme «Swingers» (1996). Disco aconselhado: «Big Bad Voodoo Daddy».

Squirrel Nut Zippers: A melhor de todas estas bandas. Originários de um lugarejo chamado Efland, o grupo (um septeto) foi fundada pelos dois vocalistas: a cantora Katharine Whalen (que é uma maravilha - uma rapariguinha branca que tem nela todoas as vozes negras que se podem imaginar) e o cantor James Mathus (que não é tão bom mas também cumpre), tendo-se fartado de tocar, imagine-se, em festas de casamento de milionários. No seu som entra o swing, sim, mas também cajun, country, tango, calipso, as «brass-bands» da música cigana, easy-listening e um forte sentido pop. Gravam quase sempre com antigos microfones de carbono. Discos aconselhados: todos («The Inevitable...», «Hot» e «Perennial Favorites»).

A marcha fúnebre aparece em alguns destes discos como se fosse a coisa mais natural do mundo. Se calhar é: em Nova Orleães ainda se dança nos funerais dos negros porque se acredita que a alma do morto está a viajar para uma outra condição (dimensão?, estado?) e que ressuscitará um dia. Tal como o próprio swing... E isto é tudo o que se quer de um baile, de um bom baile: que seja capaz de ressuscitar um morto. O resto são cantigas.

13 fevereiro, 2007

Blasted Mechanism, Anonima Nuvolari e DJ Janot - Carnavais Alternativos em Lisboa



Depois de ter dado conta do festival Entrudanças, em Entradas (ver notícia mais em baixo), aqui ficam mais três sugestões de, digamos, Carnavais alternativos, desta vez em Lisboa:

Na véspera de Carnaval, segunda-feira, dia 19, a ZDB, ao Bairro Alto, recebe um concerto dos fabulosos Anonima Nuvolari (na foto), bando de italianos radicados em Portugal que neste grupo revisitam velhas e novas canções italianas de faca-na-liga, alcoólicas e apaixonadas qb, de Renato Carosone a Fred Buscaglione, de Adriano Celentano a Paolo Conte e Vinicio Capossela. Na mesma noite, a ZDB apresenta também a música gravada mas reinventada do projecto Freestyleira, «especializado em réveillons, casamentos, baptizados, velórios e funerais, ramadões, carnavais, entre outras festividades... Aquilo que sempre quis ouvir e teve vergonha de dançar! Freestyleira: danada para a brincadeira!». Mais informações aqui.

Também na segunda-feira, entre as 20h00 e as 24h00 - mas com uma extensão na terça-feira, das 18h00 às 22h00 -, a Culturgest apresenta outra proposta de Carnaval, esta protagonizada pelo brasileiro DJ Janot, o criador da festa Brazooka e considerado «o principal DJ especializado em música brasileira». Pelas suas mãos passam temas «das raízes da MPB a Chico Buarque, Vinícius de Moraes, Elis Regina, Caetano Veloso e Djavan», entre muitos outros. Mais informações aqui.

Por último, não sendo uma festa de Carnaval, não deixa de ser um excelente ponto de partida - e muito mais que isso! - para os dias que se seguem (pelo menos também tem máscaras!): Os Blasted Mechanism apresentam o novo álbum aos fãs, sábado, dia 17, às 22h00, no Kilombo, em Benfica, com exposições, a apresentação de «Sound In Light», uma performance de dança-do-ventre tribal (!) e música gravada misturada pelo Dj Selecta Ary (pois). Reserva de entrada na festa aqui. Antes, à tarde, decorre um workshop de percussão industrial, para o qual os interessados se podem inscrever aqui.

12 fevereiro, 2007

Festival Winter Jam - Reggae Quente em Noite Fria



O Festival Winter Jam - organizado pela Positive Vibes - decorre dia 23 deste mês no Pavilhão Desportivo dos Lombos, em Carcavelos, com uma suculentíssima ementa de reggae picante e quente o suficiente para derreter o gelo destas noites de Inverno. No cartaz estão os norte-americanos Groundation (que aqui vão apresentar o seu novo álbum «Upon The Bridge» - que conta com a colaboração de Pablo Moses e Ijahman Levy -, novamente em viagem entre o roots-reggae e o jazz); o jamaicano U-Roy (na foto), ele que é considerado «The Originator» e «o pai de todos os MCs», por ter sido o pioneiro, no final dos anos 60, a fazer rimas por cima de versões instrumentais de canções de outros; o igualmente lendário e também Junior Murvin, autor do seminal «Police and Thieves», produzido por Lee «Scratch» Perry (quem não conhece, pelo menos, a estrondosa versão dos Clash para a canção que deu nome ao álbum de Murvin?); a família portuguesa One Love Family; e para animar o serão entre actuações, o também português Julah Jah Soundsystem. Mais informações aqui.

09 fevereiro, 2007

Cromos Raízes e Antenas XII


Este blog continua hoje a publicação da série «Cromos Raízes e Antenas», constituída por pequenas fichas sobre artistas, grupos, personagens (míticas ou reais), géneros, instrumentos musicais, editoras discográficas, divulgadores, filmes... Tudo isto sem ordem cronológica nem alfabética nem enciclopédica nem com hierarquia de importância nem sujeita a qualquer tipo de actualidade. É vagamente aleatória, randomizada, livre, à vontade do freguês (ou dos fregueses: os leitores deste blog estão todos convidados a enviar sugestões ou, melhor ainda!, as fichas completas de cromos para o espaço de comentários ou para o e-mail pires.ant@gmail.com - a «gerência» agradece; assim como agradece que venham daí acrescentos e correcções às várias entradas). As «carteirinhas» de cromos incluem sempre quatro exemplares, numerados e... coleccionáveis ;)


Cromo XII.1 - Ástor Piazzolla


Símbolo maior do tango e da sua renovação - o «nuevo tango» -, o músico e compositor argentino Ástor (Pantaleón) Piazzolla (nascido a 11 de Março de 1921, em Mar del Plata, Argentina; falecido em 4 de Julho de 1992) foi também o intérprete maior de um instrumento, o bandoneón, que está agora indelevelmente ligado a esse género musical feito de paixão, sangue e alma. Incorporando no tango outros elementos musicais - o jazz e a música erudita (bem presentes em temas como inesquecível «Libertango») - Piazzolla transportou o género de casas de má-fama em Buenos Aires para os grandes palcos do mundo, sem nunca por isso esquecer as suas origens e a sua verdade. Piazzolla viveu durante alguns anos da sua infância e juventude em Nova Iorque, o que poderá explicar a sua abertura ao jazz e a outros géneros musicais. Mas isso não explica completamente o seu génio absoluto e tudo o que pelo tango - e pela música - fez em toda a sua obra. Enorme!


Cromo XII.2 - Concha Buika


O nome é lindíssimo e, passe a piada, enche a boca: Concha Buika. Cantora de origem africana (Guiné-Equatorial), Concha nasceu na cidade espanhola de Palma de Maiorca, em 1972, e passou os primeiros anos da sua vida no meio da comunidade cigana local. E o resultado desta estranha «mestiçagem» só podia dar nisto: uma cantora que, na sua música, mistura jazz, boleros, flamenco, funk, música africana. A pedra de toque para a sua original fusão musical dá-se em Londres, durante um concerto de Pat Metheny, que a leva a fazer música com instrumentistas americanos e marroquinos, ao teatro com La Fura dels Baus, ao cinema e à música... house. E, depois, à sua visão pessoal de uma música sem fronteiras em que o jazz, a tradição andaluza, África, o tango e mil outras músicas não conhecem fronteiras nem passaportes. Audição aconselhada: o álbum «Mi Niña Lola» e o mais recente «Niña de Fuego».


Cromo XII.3 - Márta Sebestyén & Muzsikás



A cantora húngara Márta Sebestyén - uma das melhores e mais respeitadas em todo o universo folk/world actual -, nascida a 19 de Agosto de 1957, tem uma distinta carreira feita em nome próprio e em colaborações com jovens grupos húngaros ou com grupos estrangeiros como os duvidosos Deep Forest ou os misteriosos e fantásticos Towering Inferno. Márta é também a voz inesquecível da banda-sonora de «O Paciente Inglês». Por sua vez, os Muzsikás são a maior instituição da música tradicional húngara, descobrindo as origens ciganas ou judaicas da sua música, visitando compositores como Zoltan Kodaly ou Béla Bartók, arrasando tudo à sua passagem com os seus violinos, contrabaixos, koboz, gardon e cimbalom. Mas, ao longo das suas carreiras, é mesmo quando a voz de Márta e os instrumentos dos Múzsikas se juntam - em álbuns e ao vivo - que a verdadeira, a grande magia acontece.


Cromo XII.4 - Farinha Master


Os seus concertos eram uma surpresa constante. Neles poder-se-ia ouvir fado mutante em electrónica lo-fi, poesia concreta transmutada em hard-rock manhoso, música minimal-repetitiva passada por uma peneira minhota. E relatos de futebol e transmissões do 13 de Maio e discursos políticos. O génio irrequieto, talvez doentio, «arrasa-paredes», de Farinha Master (de verdadeiro nome Carlos Cordeiro, nascido em 1957, falecido a 18 de Fevereiro de 2002), filtrado através do seu grupo mais lendário, os Ocaso Épico, só ficou registado em disco no álbum «Muito Obrigado» (1988) mas, principalmente, no tema «Intro» (com Anabela Duarte), da primeira colectânea da Dansa do Som, «Ao Vivo no Rock Rendez Vous». Farinha ainda passou pelos WC (antes dos Ocaso Épico) e pelos Zao Ten, K4 Quadrado Azul, The Pé e Angra do Budismo (depois). Uma figura ímpar.

08 fevereiro, 2007

Bert Jansch, Waterson:Carthy e Robin Williamson - Velha Folk?... Nova Folk!



Há uma idade qualquer nos compositores/artistas/cantores em que tudo lhes parece correr mal - quando, entre algures os trinta e os quarenta e cinco anos (o «ratio» não é norma!), a música que antes faziam parece já não fazer sentido mas eles insistem em fazê-la. Mas há outra idade qualquer, às vezes perto dos cinquenta, às vezes perto dos sessenta anos, em que tudo volta a fazer sentido e os «velhos» compositores e cantores do passado voltam a uma boa forma surpreendente, criativa, revolucionária, nova de novo. Exemplos? Só na área do (chamemos-lhe) rock: Lou Reed, Bob Dylan, Patti Smith, Johnny Cash, Leonard Cohen, Marianne Faithfull, Scott Walker, David Bowie ou até - com um bocadinho de boa-vontade - os Rolling Stones. E, no caso da folk britânica, há três álbuns editados por veteranos em 2006 que voltam a pôr a «velha» folk na linha da frente outra vez: de Bert Jansch (na foto), do projecto Waterson:Carthy e de Robin Williamson.


BERT JANSCH
«THE BLACK SWAN»
Sanctuary Records

Bert Jansch - ele que foi a força-motriz dos seminais Pentangle - é geralmente mais conhecido e aclamado pelo seu trabalho como guitarrista. E também é justo: considerado muitas vezes como o Jimi Hendrix da guitarra acústica e influência maior de gente tão diferente como Jimmy Page e Mike Oldfield, Neil Young e Johnny Marr, Bernard Butler e Devendra Banhart, Nick Drake e Noel Gallagher, o guitarrista escocês é também, sempre foi, um cantor e um compositor de altíssimo gabarito. E o seu novo álbum, «The Black Swan» - considerado pelo Raízes & Antenas como o melhor da folk britânica de 2006 - é bem a prova de que Jansch continua, ultrapassados os 60 anos de idade, em altíssima forma. Acolitado neste disco por gente como Beth Orton (que canta em dois temas) e Devendra Banhart (em outro), Jansch - voz, guitarra, às vezes banjo e teclas - interpreta de forma soberba vários originais e alguns tradicionais adaptados, sempre com um trabalho de guitarra lindíssimo (falar de filigranas faria algum sentido, mas teriam que ser filigranas «simplificadas», mais um crucifixo bem trabalhado do que uma arrecada minhota), uma voz marcada por muitos anos de bom álcool e um viajar contínuo entre a folk (britânica e norte-americana), os blues e a country. Uma lição de vida e de música - de, se calhar, má-vida e muito-boa-música. (10/10)


WATERSON:CARTHY
«HOLY HEATHENS AND THE OLD GREEN MAN»
Topic Records

Possivelmente só não coloco - de uma forma injusta, irracional e absolutamente não desculpável - o novo álbum do projecto Waterson:Carthy ao mesmo nível do de Bert Jansch porque tenho estado, nos últimos anos, muito mais em contacto com o trabalho deste projecto (e dos seus integrantes) do que do de Jansch. Parece a história do «filho pródigo» - neste caso do «avô pródigo» - e de certa forma é. Dito isto há que dizer agora que o novo álbum do casal Norma Waterson e Martin Carthy, da filha de ambos Eliza Carthy e do fenomenal multi-instrumentista Tim van Eyken, ainda por cima acompanhados em muitas canções pelos Devil's Interval e as suas também maravilhosas vozes voadoras, é um disco fabuloso que nos transporta através de várias épocas e de vários locais das ilhas britânicas, tendo quase sempre como mote canções de Natal - todas tradicionais à excepção de «St John», de John Kirckpatrick, e «Jack Frost», de Mike Waterson -, nunca ortodoxas e algumas delas obviamente mais «pagãs» que religiosas. E o resultado é um belíssimo mostruário alternativo aos «Jingle Bells» e «Little Drummer Boys» desta vida, sempre diferentes - na intenção, nas harmonias, na instrumentação -, sempre um encantamento bom de se ouvir; e deveria ser de audição obrigatória em qualquer casa durante a, digamos, bendita quadra. (9/10)


ROBIN WILLIAMSON
«THE IRON STONE»
ECM

O leitor mais atento reparou, provavelmente, na editora deste disco: a ECM, uma das mais respeitadas editoras de jazz (com muitos desvios lá dentro). E, apesar de sair por uma editora de jazz e ter lá dentro músicos de jazz e alguns ambientes de jazz, este fantástico novo álbum de Robin Williamson nunca deixa de ser folk. E da melhor folk que se ouviu em muitos anos. Oiça-se, só para dar um exemplo, o fabulosa canção «The Yellow Snake», e perceber-se-á imediatamente o que quero dizer. Neste álbum, Williamson (que pertenceu a outra banda seminal, a Incredible String band) recupera muitos temas da sua discografia - entre originais, tradicionais e poemas antigos em músicas novas - e dá-lhes novas e extremamente sedutoras roupagens, com a ajuda de músicos como o veterano baixista norte-americano Barre Phillips, o também norte-americano violinista e violetista Mat Maneri e o multi-instrumentista sueco Ale Moller (conhecido dos Filarfolket e, mais recentemente, Nordan Project). Williamson, ele próprio, canta e toca vários instrumentos, com destaque para a harpa céltica (que nas suas mãos soa muitas vezes a uma kora). E o álbum é, obviamente, mais experimental, livre e aberto do que os outros aqui referidos, mas fica muito bem ao seu lado nesta lista de velha folk que é melhor do que muita da nova que por aí se vai fazendo. (9/10)

07 fevereiro, 2007

Lenine - Cantar, Cantar Sempre



Um dos mais criativos e talentosos cantores-compositores brasileiros, Lenine, apresenta o seu novo álbum «Acústico MTV», no Teatro Tivoli, em Lisboa, dia 28 de Março. Gravado com o seu grupo habitual - Jr. Tostoi (guitarra), Guila (baixo) e Pantico Rocha (bateria) - este é o primeiro álbum ao vivo do cantor. Com um leque de convidados de luxo - da cantora e acordeonista mexicana Julieta Venegas ao cantor e baixista camaronês Richard Bona, passando pelo ex-baterista dos Sepultura Iggor Cavalera e pelo rapper GOG -, o disco foi gravado em S.Paulo e já está à venda há alguns meses. Os convidados não vêm a Lisboa, mas esta é sempre uma boa oportunidade para ouvir canções como «O Atirador», «Hoje Eu Quero Sair Só» ou «Jack Soul Brasileiro».

06 fevereiro, 2007

Teresa Salgueiro - O Canto da Sereia



De Teresa Salgueiro sem os Madredeus já se sabia do projecto de versões de canções brasileiras que vão dar origem ao seu próximo álbum, «Você e Eu», com edição prevista para Março. E sabe-se agora de um outro projecto, «La Serena» («A Sereia»), em que a cantora, acompanhada pelo Lusitânia Ensemble, interpreta canções portuguesas, brasileiras, italianas, francesas e africanas de várias épocas, e, qual «sereia... chama e encanta os marinheiros». Isto é, o imenso Mar imaginário inventado pelos Madredeus continua a estar presente na carreira a solo de Teresa Salgueiro, agora com a sua voz ao serviço de muitas canções de muitos lugares. A estreia de «La Serena» está marcada para dia 16 deste mês de Fevereiro, no Centro Cultural Olga Cadaval, em Sintra, com Teresa Salgueiro a ser acompanhada pelo Lusitânia Ensemble - Jorge Varrecoso e António Figueiredo nos violinos, Ventzislav Grigorove na viola d'arco, Luis Claude no violoncelo, Duncan Fox no contrabaixo e piano e Ruca nas percussões. Mais informações aqui.

05 fevereiro, 2007

Entrudanças - Oh Entrudo Uxu Kalheiro (e Não Só)


Época de folia, animação, excessos, liberdade, bom-humor, máscaras e muita música e dança, o Carnaval (ou se se quiser, o Entrudo) é desde há alguns anos o mote para mais uma iniciativa cíclica da Pé de Xumbo: o Entrudanças. Este ano, o Entrudanças decorre entre 17 e 19 de Fevereiro, na aldeia de Entradas, Castro Verde, com bailes e oficinas de danças tradicionais e, desta vez, com uma programação mais centrada na cultura alentejana. Em parceria com a Câmara Municipal de Castro Verde e a Junta de Freguesia de Entradas, a Pé de Xumbo preparou para este festival uma ementa composta por concertos/bailes/espectáculos com os Ganhões de Castro Verde, Vozes do Imaginário, No Mazurka Band, o duo de João Gentil e Luís Formiga, Uxu Kalhus (na foto, de Mário Pires, da Retorta) e os franceses Dites 34 (França); oficinas de danças europeias, portuguesas, tango, valsa, ritmos latinos, capoeira e brasileiras; oficinas de instrumentos/voz de acordeão, flauta de tamborileiro, cante alentejano no feminino pelas Camponesas de Castro Verde e modas campaniças; passeios de tractor, oficinas de gastronomia e, a condizer com a quadra, de fatos e máscaras de Carnaval. Mais informações aqui.

03 fevereiro, 2007

Chirgilchin - Vozes de Tuva em Dose Reforçada



Os Chirgilchin - cada vez mais na linha da frente das Vozes de Tuva, a juntar aos Yat-Kha, aos Huun-Huur-Tu e à cantora Sainkho Namtchylak - regressam proximamente ao nosso país para quatro concertos durante este mês de Fevereiro: dia 22 no Cinema S. Jorge, em Lisboa, dia 23 no Teatro José Lúcio da Silva, em Leiria, dia 24 no Theatro Circo, em Braga, e dia 26 no Teatro Académico Gil Vicente, em Coimbra. Os Chirgilchin - que no Verão passado partilharam o palco com Laurie Anderson no Castelo de Montemor-o-Velho - são exímios na ancestral técnica vocal de Tuva, província russa da Sibéria que faz fronteira com a Mongólia, o «throat-singing» (que traduzido à letra significa «canto de garganta» mas que, mais bem explicadinho, pode ser traduzido por «canto difónico», «canto bitonal» ou «canto politónico»: a produção simultânea de duas emissões vocais, com uma nota fundamental vinda das cordas vocais como bordão, uma segunda nota e a melodia produzida pelas suas séries de harmónicos). No caso dos Chirgilchin, este grupo desenvolve cinco variantes diferentes do «throat singing», incluindo a sua mais famosa forma, o khoomei, sempre acompanhadas por instrumentos artesanais da sua região. Estão muito mais próximos da tradição do que os seus conterrâneos Yat-Kha (variante punk) e Sainkho (variante electrónica/experimental) mas são, também por isso, um bom pretexto para conhecer esta arte milenar.

02 fevereiro, 2007

Cromos Raízes e Antenas XI


Este blog continua hoje a publicação da série «Cromos Raízes e Antenas», constituída por pequenas fichas sobre artistas, grupos, personagens (míticas ou reais), géneros, instrumentos musicais, editoras discográficas, divulgadores, filmes... Tudo isto sem ordem cronológica nem alfabética nem enciclopédica nem com hierarquia de importância nem sujeita a qualquer tipo de actualidade. É vagamente aleatória, randomizada, livre, à vontade do freguês (ou dos fregueses: os leitores deste blog estão todos convidados a enviar sugestões ou, melhor ainda!, as fichas completas de cromos para o espaço de comentários ou para o e-mail pires.ant@gmail.com - a «gerência» agradece; assim como agradece que venham daí acrescentos e correcções às várias entradas). As «carteirinhas» de cromos incluem sempre quatro exemplares, numerados e... coleccionáveis ;)


Cromo XI.1 - Fanfare Ciocarlia


Quem já assistiu a um concerto (ou vários) da Fanfare Ciocarlia sabe ao que é que vai. A um concerto electrizante, sem dúvida, mas também ao que se vai passar a seguir ao concerto: encores longuíssimos em halls de teatros, na rua, no check-in de aeroportos. Originária da aldeia de Zece Prajini, na Roménia, a Fanfare Ciocarlia é possivelmente a mais bem conhecida banda de metais cigana da actualidade. Nascida em 1996, de uma ideia do produtor alemão Henry Ernst, que convenceu alguns dos músicos locais a formar um grupo para digressões internacionais, a Fanfare Ciocarlia nunca deixou, ao longo dos últimos dez anos, de desmentir este início, digamos, «artificial». Porque a sua música transporta sempre uma verdade e um espírito primordiais, mesmo quando fazem versões do tema do «007» ou do «Born To Be Wild». Álbuns aconselhados: «Radio Pascani», «Iag Bari» e o fabuloso «Queens and Kings», em que colaboram muitos outros músicos ciganos europeus: Esma Redzepova, Jony Iliev, Kaloome, Ljiljana Butler, KAL, Mitsou...


Cromo XI.2 - Actores Alidos


Quando se ouve falar de música vocal polifónica da ilha italiana da Sardenha, ouve-se geralmente falar de grupos masculinos - como os fabulosos Tenores di Bitti -, mas aqui fala-se de um extraordinário grupo formado por cinco cantoras e percussionistas - Valeria Pilia (a líder do grupo), Alessandra Leo, Manuela Sanna, Roberta Locci e Valeria Parisi - e um multi-instrumentista, Orlando Mascia, em instrumentos tradicionais como o launeddas (uma flauta-tripla), sulitu (flauta tradicional), trunfa (berimbau) e acordeão. Do seu reportório fazem parte cânticos sagrados, canções de embalar, serenatas, danças populares ou canções fúnebres ou de amor, usando quer temas tradicionais no seu estado puro quer adaptações da poesia sarda para composições originais. Audição aconselhada: o álbum «Canti delle Donne Sarde».


Cromo XI.3 - Griots


À semelhança dos bardos e dos trovadores europeus, os griots da zona mandinga de África (Mali, Senegal, Gâmbia, Costa do Marfim, Guinés...) são músicos e cantores que, desde há séculos, andam de aldeia em aldeia, de cidade em cidade, transportando consigo - de uma forma poética, verbal, musical - as memórias das famílias, das tribos, dos reinos. Através da voz e de instrumentos de eleição como a kora (na foto) ou o balafon, os griots (ou jelis), cantores e músicos, são o receptáculo de uma memória que vai passando de geração em geração. Tal como, aliás, os griots eles mesmos, sempre oriundos de famílias que se especializaram nesta arte ao longo dos últimos séculos, transmitindo de pais para filhos ensinamentos ancestrais. Como curiosidade refira-se que a palavra «griot» deriva do francês «guiriot», adaptação da palavra portuguesa «criado».


Cromo XI.4 - Aronas


O excelentíssimo leitor está a ver o Mozart? Sim? Então agora imagine por favor um pianista de jazz que, na Nova Zelândia, começa aos onze anos a papar os mais prestigiosos prémios do seu país nesta área musical. O músico em questão, Aron Ottignon, mudou-se entretanto para a Austrália, tocou em festivais e salas americanas e inglesas (ok, também tocou no casamento do actor Russelll Crowe), sempre com críticas do género «o feiticeiro do piano» ou «uma pipa de testosterona, Rachmaninov - vai - ao - jazz...», e formou um grupo, os Aronas, em que é acompanhado por outras três luminárias do jazz dos antípodas - David Symes (baixo), Josh Green (percussões) e Evan Mannell (bateria) - ou, nas digressões europeias, por Nick Fyffe (baixo), Paul Derricott (bateria) e Sam Dubois (steelpan). Há quem chame aos Aronas jazz-punk, mas na sua música há jazz, soul, funk, punk, ritmos tradicionais do Pacífico Sul. Uma surpresa constante. Audição aconselhada: o álbum «Culture Tunnels».

01 fevereiro, 2007

Chuchurumel - Na Caixa do Correio...


Depois de «No Castelo de Chuchurumel», o duo de Julieta Silva e César Prata (na foto), edita proximamente o seu novo álbum, «Posta-Restante», assim chamado porque cada tema é dedicado, «endereçado, a alguém em especial. Este novo disco dos Chuchurumel - que foi gravado em casa de César Prata e será masterizado no estúdio Cutting Room (Suécia) - será lançado em edição de autor e inclui um texto do musicólogo Domingos Morais e um teledisco realizado por Tiago Pereira (que venceu o DocLisboa 2006 com o documentário «11 Burros Caem no Estômago Vazio»). Tiago Pereira que será também uma presença constante nos próximos concertos do grupo, projectando imagens de vídeo pré-gravadas, síncronas com a música, mas também imagens captadas em tempo real.